Há uma notícia
promissora para quem sofre da doença de Alzheimer. Uma série de experimentos
conduzidos por uma equipe internacional coordenada pelos neurocientistas
Fernanda De Felice e Sergio Ferreira, da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ), indica que uma medicação aprovada em 2005 para tratar o diabetes tipo 2
parece deter e até reverter o avanço do Alzheimer.
Em
um artigo publicado em 23/3 no Journal of Clinical
Investigation, o grupo de Fernanda demonstrou que o
medicamento exenatida-4 exerce um efeito protetor sobre os neurônios, as
células cerebrais responsáveis pelo transporte e pelo armazenamento de
informações, em geral danificadas no Alzheimer. Administrada a camundongos
geneticamente alterados para apresentar os efeitos típicos da doença
neurodegenerativa, a exenatida reverteu os danos no cérebro e melhorou a
memória dos roedores. Resultados semelhantes estão sendo observados nos
experimentos ainda em andamento com macacos cinomolgos, realizados no
laboratório de Douglas Munoz na Queen’s University, no Canadá, um dos
colaboradores de Fernanda.
A maioria das
pessoas pode estranhar a ideia de usar uma medicação contra o diabetes, que
atinge os tecidos e órgãos ditos periféricos, para combater uma enfermidade que
afeta o cérebro, no sistema nervoso central. Mas estudos feitos no Brasil e no
exterior na última década tornam cada vez mais evidente que as duas
enfermidades compartilham um mecanismo bioquímico comum.
Anos
atrás o grupo do Laboratório de Doenças Neurodegenerativas da UFRJ, coordenado
por Fernanda e Ferreira, seu marido, demonstrou haver um elo em comum entre
diabetes e Alzheimer: o aproveitamento inadequado da insulina, hormônio
produzido pelo pâncreas. Na maioria dos tecidos do corpo, a insulina ajuda as
células a extrair do sangue a glicose (um tipo de açúcar) e a convertê-la em
energia. No cérebro, porém, sua ação é diferente. Ao aderir a uma proteína da
superfície dos neurônios, a insulina desencadeia as reações químicas que levam
à aquisição e à consolidação da memória.
Assim
como no diabetes, a resistência à insulina surge no Alzheimer como consequência
de uma inflamação. Testes com células e com camundongos, feitos pelas
pesquisadoras Theresa Bomfim e Leticia Forny-Germano, e com cinomolgos,
realizados por Jordano Brito-Moreira, demonstraram que pequenos aglomerados de
um peptídeo – os oligômeros beta-amiloide, formados nos estágios iniciais do
Alzheimer – estimulam a produção de uma molécula sinalizadora da inflamação que
bloqueia o efeito da insulina.
Com a exenatida,
Fernanda e sua equipe conseguiram restituir a sinalização da insulina nos
neurônios. “Queríamos fazer um trabalho que tivesse a possibilidade de se
transformar rapidamente em uma aplicação clínica para essa doença devastadora”,
conclui.