domingo, 18 de março de 2012

Conexões viscerais


Há muito tempo sabe-se que existe cerca de 100 trilhões de bactérias nos intestinos e até então acreditava-se que a presença dessas bactérias era benéfica para elas e seus hospedeiros na maior parte das vezes, ou ainda que, no máximo, não favorecesse nem prejudicasse qualquer um dos lados. Porém, nos últimos anos surgiram estudos mostrando que, em alguns casos, a intimidade contínua pode trazer consequências indesejáveis para o hospedeiro.
A equipe do médico Mário Abdalla Saad, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), publicou um estudo na revista PloS Biology demonstrando que um determinado grupo de bactérias intestinais pode, em certas situações, iniciar um desequilíbrio metabólico que quase sempre leva ao desenvolvimento de diabetes e obesidade.
A alteração que antecede o diabetes e o ganho excessivo de peso é o que os médicos chamam de resistência à insulina. Quando a resistência à insulina se instala, o corpo deixa de usar de maneira adequada o hormônio que permite às células dos músculos e de outros tecidos retirar o açúcar do sangue e convertê-lo em energia ou estocá-lo para usar mais tarde. Em experimentos com camundongos, a equipe de Saad verificou que por trás da resistência à insulina podem estar as bactérias do filo Firmicutes.
O aumento da proporção de Firmicutes na microbiota intestinal parece influenciar o surgimento de diabetes e obesidade de duas maneiras: por melhorar a capacidade de extrair energia dos alimentos ou por contribuírem para o desenvolvimento de uma inflamação sutil, típica da obesidade, que se espalha pelo organismo e interfere no aproveitamento da insulina.
Porém, não são as Firmicutes que disparam a inflamação. Elas apenas parecem facilitar a passagem de pequenos fragmentos de outras bactérias – constituídos de lipopolissacarídeos (LPS) - pela delicada parede dos intestinos, que vão se aderir a receptores na superfície de diferentes tipos de células do corpo. Ao se conectarem à membrana dos macrófagos, os LPS acionam sinais bioquímicos que colocam o sistema imunológico em alerta e iniciam a inflamação leve. Nas células dos músculos, do fígado e do tecido adiposo os sinais inflamatórios disparados pelos LPS também geram um efeito distinto: impedem o uso da insulina e a entrada de glicose nas células – é a resistência à insulina. A exposição prolongada ao LPS faz a resistência à insulina se instalar primeiro no fígado depois nos músculos e só mais tarde ela atinge o tecido adiposo.
O trabalho da PLoS Biology abre caminho para se buscar novas formas de combate e prevenção ao diabetes e à obesidade. “Não estamos propondo o uso de antibiótico para tratar a obesidade; no estudo eles servem para provar um conceito”, alerta Saad. Alguns acreditam que os probióticos, compostos contendo microrganismos vivos, possam ajudar a desenvolver uma microbiota que evite o ganho de peso, mas não está comprovado. “Talvez funcione como prevenção, antes que se comece a engordar”, imagina Saad.
Enquanto não avançam os testes, a saída menos arriscada é praticar exercícios físicos e apostar em uma dieta com pouca gordura.


Para mais informações sobre o estudo realizado, acesse a notícia na íntegra.

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